por Bruno Freire Maia Rodrigues Costa
O Código de Mineração disciplina, através dos artigos 26, 32 e 65, §1º, o procedimento de disponibilidade das áreas minerárias desoneradas.
MEIRELLES [1] ensina que o procedimento de disponibilidade é, ao mesmo tempo, declaração pública de liberação atípica da área e licitação, devendo observar seus requisitos de validade: procedimento formal, publicidade dos atos, igualdade entre os licitantes, sigilo na preservação das propostas, vinculação ao edital, julgamento objetivo e adjudicação compulsória ao vencedor.
William Freire [2] ensina que:
“O conceito de disponibilidade é de grande importância para o Direito Minerário, já que a adjudicação ao licitante vencedor constituirá forma derivada de aquisição do direito minerário”.
Para Pedro A. Salomé de Oliveira [3]:
“A declaração de disponibilidade é nada além do que o ato da autoridade competente, tornado público para que se saiba que determinada jazida, até então onerada por direito prioritário ou por concessão encontra-se livre para habilitação futura ou nova concessão a eventuais interessados”.
A Portaria DNPM 268/2008[4], publicada no D.O.U. de 11/07/2008, regulamentou o procedimento de disponibilidade das áreas desoneradas e estabeleceu, em seu artigo 2º, que o referido procedimento seria instaurado mediante Edital e após o trânsito em julgado da decisão de desoneração da área.
Os parágrafos 2º e 3º do citado artigo 2º, complementando os requisitos de validade da instauração do procedimento de disponibilidade, determinam que:
“§2º. O edital de que trata este artigo será publicado no Diário Oficial da União e ficará disponível no sítio eletrônico do DNPM para consulta durante o prazo fixado para apresentação das propostas.
§3º. O prazo para apresentação das propostas será de 60 (sessenta) dias, no procedimento de disponibilidade de que trata o art. 26 do Código de Mineração e, para a disponibilidade de que tratam os arts. 32 e 65, §1º, do Código de Mineração, no prazo fixado no edital, contados de sua publicação no Diário Oficial da União”.
Conclui-se, assim, que a instauração de qualquer procedimento de disponibilidade de jazida, iniciado após a publicação da Portaria DNPM 268/2008 deverá atender, cumulativamente, a dois requisitos:
a) publicação do Edital de Disponibilidade no Diário Oficial da União;
b) veiculação do Edital de Disponibilidade no sítio eletrônico do DNPM, durante o prazo fixado para apresentação de propostas.
Uma vez apresentado o conceito legal e doutrinário do procedimento de disponibilidade de jazida, e depois de demonstrados os requisitos necessários para sua validação, podemos resumir a questão a ser discutida no presente artigo em apenas uma pergunta: as informações processuais disponibilizadas nos sítios eletrônicos das autarquias federais são válidas para contagem de prazos e servem, portanto, de base para que a parte pratique seus atos, ou se prestam, tão somente, para mera conferência?
Com o objetivo de aprofundar ainda mais nesta questão, devemos imaginar a seguinte situação: uma área é colocada em disponibilidade, posteriormente à publicação da Portaria DNPM 268/2008 por decisão fundamentada por parte do Diretor-Geral do DNPM. O Edital de Disponibilidade é publicado no Diário Oficial da União. O Minerador interessado em área onerada que lhe é interessante verifica, diariamente, as informações que são lançadas no sítio eletrônico do DNPM e percebe que:
a) O DNPM não veiculou, em seu sítio eletrônico, o Edital de Disponibilidade e, ainda, que;
b) O DNPM atualizou as informações constantes do Cadastro Mineiro[5] depois de escoado o prazo para apresentação de propostas por parte de eventuais interessados.
Poderia o procedimento de Disponibilidade, neste caso, ser declarado nulo?
Entendemos que sim.
A primeira situação (não veiculação, no sítio do DNPM, do Edital de Disponibilidade) dispensa maiores comentários. Afinal, se o instrumento legal (Portaria DNPM 268/2008) que rege a instauração do procedimento de disponibilidade determina, de forma cumulativa, a publicação do Edital no D.O.U. bem como sua disponibilização no sítio eletrônico do DNPM, o ato administrativo que determina, tão somente, a publicação no D.O.U., cumpre de forma parcial uma determinação legal. Não pode, portanto, ser considerado válido e se torna, assim, incapaz de produzir efeitos no mundo jurídico.
A segunda situação (DNPM atualiza as informações constantes do Cadastro Mineiro depois de escoado o prazo para apresentação de propostas por parte de eventuais interessados) embora enseje o mesmo resultado – declaração de nulidade do procedimento de Disponibilidade – necessita de maiores explicações.
O entendimento jurisprudencial atual admite que as informações processuais inseridas na Internet de forma incorreta ou inadequada constituem, nos termos do artigo 183, § 1º, do Código de Processo Civil, justa causa para a reabertura de prazo para exercício de determinado ato processual que incumbia à parte.
Decidiu-se, no Recurso Especial nº. 390.561-PR, de relatoria do Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 26.08.2002, que as informações processuais errôneas expostas na Internet constituem justa causa para a não interposição tempestiva do recurso:
“EMENTA: PROCESSUAL – PRAZO – JUSTA CAUSA – INFORMAÇÕES PRESTADAS VIA INTERNET – ERRO – JUSTA CAUSA – DEVOLUÇÃO DE PRAZO – CPC, ART. 182. – Informações prestadas pela rede de computadores operada pelo Poder Judiciário são oficiais e merecem confiança. Bem por isso, eventual erro nelas cometido constitui ‘evento imprevisto, alheio à vontade da parte e que a impediu de praticar o ato’. Reputa-se, assim, justa causa (CPC, Art. 183, § 1º), fazendo com que o juiz permita a prática do ato, no prazo que assinar (Art. 183, § 2º)”[6]
As informações veiculadas nos sites das autarquias federais, de igual maneira, devem ser absolutamente corretas e fidedignas. Esta presunção decorre do preceito estampado no artigo 37 da Constituição da República que determina que:
“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de (…) eficiência (…)”.
Um dos princípios que guia toda a atividade da Administração Pública é a eficiência, que possui grande repercussão nos serviços públicos, como bem sintetiza José dos Santos Carvalho Filho[7]:
“Deve o Estado prestar seus serviços com a maior eficiência possível. Conexo com o princípio da continuidade, a eficiência reclama que o Poder Público se atualize com os novos processos tecnológicos, de modo que a execução seja mais proveitosa com menor dispêndio. (…) É tanta a necessidade de que a Administração atue com eficiência, curvando-se aos modernos processos tecnológicos e de otimização de suas funções, que a Emenda Constitucional nº 19/98, incluiu no art. 37 da CF o princípio da eficiência entre os postulados principiológicos que devem guiar os objetivos administrativos (…)”.
As autarquias federais que prestam informações nas suas páginas na rede mundial de computadores o fazem por observância aos Princípios da Publicidade e da Eficiência, sendo de sua responsabilidade os erros daí advindos.
Ainda que se admitisse o dever do Minerador consultar diariamente o Diário Oficial da União, tal não elide a nulidade da Disponibilidade.
O DNPM tem como praxe e norma lançar as Disponibilidades no Cadastro Mineiro e no site, na parte de Editais Publicados. Portanto toda a comunidade mineral vale-se deste duplo sistema para nortear suas ações.
Concluindo: se o DNPM disponibiliza no Cadastro Mineiro as informações acerca da disponibilidade da área de qualquer processo depois de escoado o prazo para eventuais habilitações, e, portanto, em descompasso com as publicações havidas na imprensa oficial, nenhum prejuízo poderá ser atribuído ao Minerador, devendo o ato ser revisto para corrigirem os vícios apontados.
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[1] Hely Lopes, MEIRELLES. Licitação e contrato administrativo. 4ª edição. RT, 1979. p. 10
[2] FREIRE, William. Comentários ao Código de Mineração. Belo Horizonte. 2ª ed. Aide,1996. p. 120
[3] SALOMÉ DE OLIVEIRA, Pedro A. O Conceito de Disponibilidade no Direito Minerário. Brasília. IBRAM: 1990.
[4] Revogou expressamente as Portarias DNPM 419/1999, 48/2000, 251/2001, 152/2006, a Instrução Normativa 12/2000 e a Circular 3/2000.
[5] Sistema de acompanhamento processual eletrônico, disponibilizado pelo DNPM e que reúne informações sobre os processos de Mineração.
[6] Neste sentido, encontram-se no Superior Tribunal de Justiça: o REsp. nº 557.103-MG, relator o Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, STJ, DJ de 09.08.2004; e o REsp. nº 538.642-RS, relator o Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, STJ, DJ de 28.10.2003.
[7] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Direito administrativo. 10. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, pp. 268-269.
Fonte: William Freire Advogados Associados