William Freire
Os efeitos do COVID-19 — como a quarentena e a paralisação de alguns setores da economia — foram imprevisíveis e inevitáveis. Portanto, diante da magnitude dos efeitos negativos causados às empresas de mineração, podem se enquadrar no Instituto denominado caso fortuito.
A Agência Nacional de Mineração e os órgãos ambientais responderam rapidamente, suspendendo vários prazos. Entretanto, a realidade das empresas vai muito além do que o criador da norma pode prever.
Certamente ocorrerão situações em que a empresa se verá envolvida em dificuldades e atrasos, cuja solução demandará muito mais tempo que o prazo da suspensão administrativa. Constatar-se-ão casos de equipes que foram desmobilizadas e que precisaram ser novamente mobilizadas, situações em que a assistência técnica ficou comprometida ou equipes técnicas reduzidas ou sobrecarregadas. Muitos resultados de análises e testes de amostras enviadas ao exterior atrasarão e muitas empresas se verão em situações difíceis.
Há uma regra inafastável: Àquele que sofrer um obstáculo da magnitude de um caso fortuito compete o dever de comprová-lo, a fim de se evitarem os efeitos do não cumprimento da obrigação.
Se o conceito de caso fortuito é jurídico, a formação do conjunto probatório, que é sensível, deve ter abordagem multidisciplinar. Há muitos riscos assintomáticos à espreita: risco de perda de prazos, dificuldade para concluir relatórios com qualidade, indeferimento de prorrogações de prazos. O empecilho e o atraso ocorrem agora, mas seus efeitos graves somente são percebidos daqui a alguns meses, às vésperas do prazo para cumprir obrigação relevante, como são os TACs, as condicionantes da licença ambiental, a apresentação de relatórios complexos como o PAE, pedido de prorrogação do prazo da autorização de pesquisa, entre outros.
Para que a memória dos efeitos do caso fortuito e das providências para superá-los não se perca, há uma providência relevante e urgente: iniciar, imediatamente, a formação do conjunto probatório dos efeitos do caso fortuito para a empresa, enquanto os dados estão frescos e os registros não estão dispersos. Se, ao final, mesmo com o esforço razoável, não for possível cumprir a obrigação, a empresa terá argumentos e provas para demonstrar à ANM, aos órgãos ambientais, ao MP ou ao Judiciário. Esse esforço razoável, considerando a capacidade e a possibilidade de diligência do homem médio, deverá ser examinado pelos órgãos sem apego ao formalismo exagerado, observando, entre outros, os princípios da razoabilidade, proporcionalidade, segurança jurídica, interesse nacional e interesse público. Com essas precauções, é possível admitir o afastamento de sanções por eventual descumprimento de uma obrigação ou obter a extensão do prazo para seu cumprimento.